quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Vem golpe por aí (Carlos Chagas)

BRASÍLIA – Revela a mais recente pesquisa, feita pela Datafolha: depois de 70% para o presidente Lula, 8% para Dilma Rousseff. Entre os dois extremos, 41% para José Serra. Diante dos números, fica difícil evitar a conclusão: para impedir que os tucanos ocupem o palácio do Planalto, não será com a chefe da Casa Civil. Apenas o presidente Lula evitará a débâcle dos companheiros e seus associados.

Adianta pouco alegar que Dilma tinha 3% e subiu cinco degraus nas preferências populares. Muito menos, que o presidente Lula está impedido de candidatar-se outra vez. Para todos, vale a manutenção ou a conquista do poder, capaz de atropelar a ética, os postulados constitucionais e a frágil democracia que insistimos existir.

Vem golpe por aí, como veio no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, mudando a Constituição para permitir-lhe disputar um segundo período de governo no exercício do primeiro. Se o PSDB pode enxovalhar as instituições, por que não poderão o PT e aliados?

Ilude-se quem quiser. À medida que o tempo passa mais se comprime na garganta dos atuais donos do poder o grito de que, para preservá-lo, vale tudo. No bojo da reforma política, já no primeiro semestre do ano que vem, virão o terceiro mandato ou a prorrogação de todos os mandatos por dois anos. Importa menos se o presidente Lula não quer, porque acabará querendo, como solução final. Do Congresso, não se duvida estar a postos para alterar as regras do jogo tantas vezes alteradas no passado.

E se alguém imagina o Supremo Tribunal Federal servindo de barreira para mais uma abominável violação das instituições, será bom lembrar que a mais alta corte nacional de justiça não agiu assim quando deputados e senadores aprovaram a reeleição. Reconheceu o direito de o Legislativo alterar a Constituição, como reconhecerá outra vez, ainda mais com sete de seus onze ministros indicados pelo governo Lula.
O efeito Heloísa Helena

Ela alcançou 14% contra Serra e 19% contra Aécio. Heloísa Helena é um fenômeno, mesmo sem mandato, banida das telinhas da TV-Senado, obrigada a retomar seu emprego de professora e exilada nas Alagoas. Acaba de eleger-se a vereadora mais votada em Maceió, mas isso não explica sua popularidade no País inteiro. A explicação é mais profunda: a guerreira vai recebendo, por sua coerência, as preferências que deveriam ir para Dilma Rousseff ou outro petista qualquer.

Não é hora de julgá-la, de saber se é anacrônica ou moderna, utópica ou realista. A verdade é que sem o menor suporte da mídia, das elites e sequer do sindicalismo, ela recebe razoável parcela de apoio nacional. Encarna a esquerda verdadeira, aquela que, outra vez sem juízos de valor, mantém-se na defesa do socialismo. Já pensou se Heloísa Helena chegar ao segundo turno? Em quem votarão os companheiros? Nela ou em José Serra?
A quem pensa enganar?

Investiu o PT contra o PSDB, em reunião no fim de semana. Os tucanos são acusados de haver conduzido o País atrás da vaca, ou seja, para o brejo, com a política econômica neoliberal dos dois governos do sociólogo. Propuseram os companheiros mudanças profundas e até apresentaram um elenco: fortalecimento maior do Estado; investimentos públicos pelos bancos estatais; programas de transferência direta de renda para os cidadãos; redução do superávit primário; queda imediata dos juros; intervenção na política cambial; proibição de demissões.

A gente pergunta como puderam produzir tanta desfaçatez, ingenuidade e malandragem. Porque suas propostas não atingem apenas o governo anterior. Fulminam os seis anos do governo Lula, que só fez copiar o modelo recebido. O PT é tão culpado quanto o PSDB, se estamos colhendo agora os frutos de uma política de lesa-pátria e de entrega do País à especulação desmedida, interna e externa.

Fizeram algum protesto, os petistas, durante esse tempo em que o Lula aplicou a mesma política de FHC? Insurgiram-se contra o lucro abusivo dos bancos e o desmonte do poder público? Criticaram a transferência de renda do setor público para o setor privado? Manifestaram-se contra o aumento dos juros e do superávit primário? Exigiram a proibição de demissões diante da crise econômica, para contrabalançar as dezenas de bilhões injetados em empresas quase falidas?

Agora, como se fossem Congregados Marianos, acusam o demônio pela indução aos pecados por eles mesmo praticados.
Eufemismos

Certas elites, a quem pensam enganar? Por ingenuidade ou má-fé, nos Estados Unidos e no Brasil, em plena crise econômica, a maioria do noticiário não se refere a demissões. Nem em massa, acontecendo lá, nem caminhando para isso, aqui. Falam em extinção de postos de trabalho...

Pensam que as massas são bobas, que o trabalhador é tolo. Imaginando não chocar nem despertar reações de indignação nos demitidos, apelam para o eufemismo: não há demissões, mas extinção de postos de trabalho...

Já é um crime poderosas empresas obrigarem seus empregados a tirar férias coletivas, ante-sala das demissões. Imagine-se os milhares de operários forçados a ir para casa sem saber como nem se voltarão para as fábricas. No mínimo, deixam de gozar, mas sofrem as férias em estado de monumental depressão.

Se pelo menos a semântica fosse respeitada, em vez de férias as empresas deveriam falar em dispensa remunerada. E no lugar de extinção de postos de trabalho, em demissões...

Da Tribuna da Imprensa

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Cada vez mais viável candidatura do presidente Lula a um terceiro mandato (Carlos Chagas)

Antecipada a briga pela vice

BRASÍLIA - A disputa acirra-se antes mesmo de realizadas as eleições municipais e de conhecidos os seus resultados: PMDB, de um lado, e pequenos partidos aliados do governo, de outro, já se engalfinham para indicar o candidato à vice-presidência da República na chapa de Dilma Rousseff. Ou, como alternativa meio malandra, para ocuparem o mesmo lugar numa hipotética, mas cada vez mais viável candidatura do presidente Lula a um terceiro mandato.

O prêmio parece apetitoso, num caso ou no outro. O PMDB já começou a triagem, tendo como possíveis indicados os governadores Sérgio Cabral e Roberto Requião, os ministros Nelson Jobim e Edison Lobão, o deputado Michel Temer, que nesse caso até abriria mão de candidatar-se à presidência da Câmara e, fechando o círculo, por que não o presidente do Senado, Garibaldi Alves?

Do lado dos pequenos partidos da base oficial, uma candidatura sobressai, a do deputado Ciro Gomes, que no último fim de semana admitiu publicamente a possibilidade. Decidirá a questão o presidente Lula, mas no momento certo, ou seja, lá para o final do ano que vem. As preliminares, porém, já estão postas. Açodadamente, sem dúvidas, mas dentro da lição daquele velho provérbio árabe, de que bebe água limpa quem chega primeiro na fonte. Começando pelo começo, como diria o saudoso Chacrinha.

Sérgio Cabral tornou-se a mais nova estrela do universo lulista. Faz tudo o que seu mestre manda e, em retorno, recebe até mais do que o governo federal poderia dar ao Rio de Janeiro. Juventude e experiência não são incompatíveis, nesse caso, pois o Serginho, como é carinhosamente chamado, consegue superar parte dos gravíssimos problemas do estado e da antiga capital. No PMDB, ocupa a pole-position.

No partido que já foi do dr. Ulysses, fosse para seguir as lições do patrono e Roberto Requião venceria qualquer convenção, desde que para indicar o candidato ao Palácio do Planalto. Para vice, há divergências, tendo em vista a independência do governador do Paraná e, até mesmo, suas posições polêmicas. Mas está no páreo.

Houve tempo, há mais de um ano, que Nelson Jobim usava a coroa de príncipe de Gales. Deixando o Supremo Tribunal Federal antes do prazo, com certa ingenuidade disputou a pré-indicação para presidente do PMDB, sendo enrolado pelas raposas felpudas do partido. Hesitou um pouco, mas aceitou tornar-se ministro da Defesa, numa quadra delicadíssima onde não foi poupado o correto Waldir Pires.

Cresceu, mesmo criando um caso por dia com suas declarações - coisa que mais ou menos continua até hoje. Participa daquele grupo que, no governo e no PMDB, não se enquadra na ortodoxia da prática política. Está para o que der e vier, já que não dará mesmo para disputar seu objetivo maior, o Palácio do Planalto.

Edison Lobão não disputa a condição de estrela maior no céu de brigadeiro em que se tornou o governo Lula. É um cometa de grandes proporções e luminosidade. Enganou-se quem imaginou se constituísse num corpo estranho no governo, uma imposição do PMDB ao chefe maior. Por competência política e sorte, tornou-se Minas e Energia o ministério do coração do Lula. Só não recebe mais telefonemas diários do presidente do que Dilma Rousseff. Mas deixa longe Guido Mantega e qualquer outro.

Da descoberta do petróleo no pré-sal à entrada em carga da nona turbina de Itaipu, da programação de 50 novas usinas nucleares ao chega-para-lá dado na Petrobras, da firmeza com que negociou a nova partida do gás boliviano à condição de convidado especial na última reunião da Opep, o senador poderá ser levado a arquivar o sonho de voltar a governar o Maranhão, se for à troca da vice-presidência na chapa encabeçada pelo PT.

Michel Temer pode ser considerado a "opção Bom-Bril", excelente para mil e uma utilidades. Consegue dar nó em pingo d'água, mantendo-se há mais de uma década na liderança do PMDB, como seu presidente, capaz de compor interesses tão conflitantes quanto explosivos. Se os pretendentes acima citados forem sendo escanteados, cada um por uma razão engendrada no comando do partido, sobrará quem, a não ser Temer?

Para Garibaldi Alves sobra a condição de uma espécie de regra-três de Michel Temer. Cresceu na presidência do Senado, até batendo de frente com o Executivo, na questão das medidas provisórias. Se o presidente Lula quiser alguém tão independente quanto leal, não esquecerá de mandar botar Garibaldi na lista "como maior de espadas". A referência vai para uma das múltiplas rasteiras que Getúlio Vargas passou nos políticos quando se tratou de indicar o novo governador de Minas, dada a morte de Olegário Maciel. Entre Virgílio de Mello Franco e Gustavo Capanema, o caudilho mandou relacionar, só para constar, o nome de Benedito Valadares. Poderia Lula fazer o mesmo?

Com relação aos pequenos partidos, surpresas poderão acontecer, já que PSB, PC do B, PTB, PDT, PR e PP, entre outros, não se entendem mesmo. Um nome, porém, sobressai do conjunto, até já referido pelo presidente Lula. É o ex-governador e ex-ministro Ciro Gomes, duas vezes candidato presidencial derrotado, uma por Fernando Henrique, outra pelo Lula. Dias atrás ele declarou admitir tornar-se companheiro de chapa de Dilma Rousseff. Disse que jamais ficará contra o presidente da República, ou seja, só disputaria a presidência como indicado dele.

Em suma, o quadro hoje é esse, tornando-se óbvio que, com tantos candidatos disputando a vice-presidência, o natural é que logo se engalfinhem. E com o beneplácito do Lula, que de ingênuo não tem nada. Aos referidos pré-candidatos abrem-se duas opções: ser vice de Dilma ou de... (cala-te boca).