BRASÍLIA - Estão consolidadas as instituições brasileiras? Sem dúvida. Cumprem-se as decisões do Judiciário. O Legislativo funciona de acordo com seus próprios postulados. O Executivo administra sem contestações. União, estados e municípios não atropelam as respectivas atribuições. As forças armadas mantêm-se no limite de seus deveres constitucionais.
A imprensa trabalha com plena liberdade, assim como os advogados exercem suas prerrogativas sem limitações. As diversas religiões praticam seus credos livres de qualquer constrangimento.
Pois é. Agora vejam o que disse o presidente Lula, sexta-feira, na Venezuela: "A consolidação das instituições permite a quaisquer partidas condições de propor a reeleição permanente, e aos parlamentos de aprová-la." Referia-se às pretensões do presidente Hugo Chávez de perpetuar-se no poder, até elogiando as instituições consolidadas daquele país.
Mas o que vale para a Venezuela não vale para o Brasil? Ou estariam nossas instituições incompletas ou em frangalhos?
Basta tirar as conclusões, apesar de o presidente brasileiro, na mesma ocasião, haver declarado pela milésima vez não pretender candidatar-se ao terceiro mandato. Só que agora foi mais longe. Chegou a observar que Fernando Henrique Cardoso só não pleiteou mais um período por causa da situação econômica, afirmação que o sociólogo está obrigado a desmentir, se puder, ele que eleito para um mandato mudou a Constituição e ficou outro.
Para bom entendedor, dois passos à frente, um passo atrás. O Lula está mais perto da meta que repudia mas vai tornando viável. Ou o Reino Unido, a Espanha e a Alemanha, como disse, não dispõem de governos longos?
É bom prestar atenção num segundo comentário do Lula sobre reeleições continuadas: "(...) Isso pode acontecer. Na hora em que você tiver instituições consolidadas e tiver a liberdade política que o povo quiser, isso vai acontecer". Acontecer onde, carapálida? Para quem duvidava, apesar das contradições, sucedem-se as evidências...
Fazer o quê?
O desemprego vem em ondas, como o mar. Pelo jeito, não mais em marolinhas, mas em tsunamis. Pelo menos, 650 mil fechamentos de postos de trabalho registraram-se até dezembro, dos quais 120 mil naquele mês.
Aguardam-se novas medidas do governo para estimular as empresas a produzir e como consequência evitar mais demissões. As indústrias insistem numa equação capenga, ou seja, aceitam a ajuda mas não se comprometem com a preservação dos empregos.
Para o presidente da República e seus ministros, tanto quanto para os empresários, trata-se de uma questão teórica, essa de retomar o crescimento, estimular o crédito e evitar o desemprego. Pode-se acrescentar que também para os dirigentes sindicais, aqueles que dispõem de estabilidade e ainda se penduram em cargos DAS.
No intervalo de suas prolongadas reuniões, saem todos para almoçar e jantar, uns em restaurantes de luxo, outros atrás de pratos feitos, mas sem preocupações com a subsistência. De noite, repousam sem pensar no pagamento do aluguel ou se a mulher e os filhos deixarão de ir às compras ou à escola. O desemprego, para os que cuidam dele, parece tão distante quanto as nuvens.
Agora, é bem diferente para o operário que chegou à fábrica e soube estar despedido. Por enquanto, ele ainda recebe pequena indenização, se é que a FIESP não conseguiu flexibilizá-la nas reuniões de ontem à noite, mas a perspectiva aberta a partir da demissão é pavorosa. Sair atrás do seguro-desemprego adiantará muito pouco. Peregrinar atrás de outro trabalho será humilhante, depois de múltiplas tentativas fracassadas.
Governo, empresários e sindicalistas precisariam sentir, na pele, as agruras da demissão em massa. Só assim chegariam rápido a soluções eficazes, daquelas que o elitismo impede.
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